PAUSA PARA REVER O TEMPO
doía
como se cada dobra do corpo
fosse um cotovelo encostado no vazio —
e o vazio, só meu.
o carro dormia
desligado à beira do farol
onde a pressa dos outros
era um espetáculo de partidas.
do meu posto quieto
entre o vidro e o tempo
via multidões se lançarem
como se os sinais soubessem tudo
menos o que é ficar.
tudo ali era pressa:
as pernas, os passos, os olhos baixos.
menos eu,
que era pausa
e lembrança.
havia um peso sem nome,
um suspiro sem medicina,
um querer de colo, de travesseiro antigo,
de casa de antes.
queria recomeçar
como quem chega de viagem
e encontra a porta entreaberta
com cheiro de pão e perdão.
queria que os dias
fossem assim —
sem as cores de comando dos semáforos,
sem as urgências que atropelam.
queria,
acima de tudo,
vislumbrar teu rosto de novo,
e esse teu gesto silencioso
que me pediu um tempo,
uma pausa —
sem dizer se era fim
ou volta.