domingo, 21 de junho de 2015

BILHETE ÚNICO PROIBIDO

 

Bilhete Único Proibido

 

Passagem só de ida,

código de barras rasurado,

pra lugares que nunca existiram,

mapas em tela 404,

endereço não encontrado.

 

Sonhos do amigo mais amigo,

arquivos corrompidos,

deleted.

Não foram considerados,

memória RAM insuficiente

pra tanto afeto.

 

Ficou o eco digital

de um adeus sem porta,

um "vai com Deus" sem chão.

E a mochila leve

de quem partiu

pra um lugar só seu,

onde a ausência

é a única lei.

 

sábado, 20 de junho de 2015

AMIGO DO REI

 

AMIGO DO REI

 

O protocolo me sufoca, a seda, um peso na pele.

Sorrisos calculados, ecos vazios naquela sala de espelhos.

Eles falam de poder, de guerras e de fortunas,

enquanto eu observo a poeira dançar nos raios de sol furtivos.

 

Eu também sou amigo do rei, dizem.  Mas a amizade se resume

a um aperto de mão frio, a um nó na garganta,

a uma palavra seca, solta no labirinto de seus desejos.

 

Meu reino é a sombra que se estende além dos muros,

a solidão que floresce no jardim negligenciado.

A amizade que ofereço é a da escuta atenta,

o silêncio que acolhe o peso de uma coroa.

 

Não preciso de banquetes, nem de joias cintilantes.

Minha lealdade reside no olhar que desvenda a máscara,

na compreensão que não julga, na palavra não dita

que ecoa mais forte que os cânones e os hinos reais.

 

Eu sou o amigo invisível, o reflexo no espelho quebrado,

a lembrança silenciosa da humanidade que se esconde

sob o brilho opressor do ouro e do cetro.

Eu também sou amigo do rei, em minha própria maneira,

e isso, talvez, seja a verdadeira realeza.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

QUANDO TE SONHO, EXISTO

 

Quando Te Sonho, Existo

 

A escuridão da noite não é vazio,

mas um portal que se abre

para o reino do possível,

onde as regras do dia se desfazem.

 

É ali, no palco macio do sono,

que tua forma se materializa,

mais vívida que a luz da manhã,

mais real que a palma da minha mão.

 

Teu riso ecoa, teu toque se acende,

e a ausência que me consome desperto

se dissolve em um abraço perfeito.

Cada detalhe teu é gravado

na carne do meu sonho.

 

E por alguns instantes mágicos,

minha alma se encontra,

o coração bate no ritmo certo,

o ar que respiro tem um cheiro,

um sentido profundo.

 

Acordo, e o corpo volta a pesar,

o quarto é apenas um quarto.

Mas a verdade é que só existo,

plenamente, verdadeiramente,

naqueles breves e infinitos momentos

em que te sonho.

 


segunda-feira, 15 de junho de 2015

PORTA TRANCADA POR DENTRO

 

Porta Trancada Por Dentro

 

E a porta trancada por dentro,

não é parede, é barreira.

Não há chave, não há fresta,

apenas a mão que a segura,

a minha própria,

que não cede, não liberta.

 

É um ato de auto-prisão,

uma escolha sem nome,

que prende o passo, cala a voz.

O lado de fora, um sussurro distante,

o que poderia ser, um sonho.

 

E o silêncio aqui dentro,

não é paz, é eco.

O eco das chances perdidas,

dos caminhos não tomados.

A porta, um espelho turvo,

refletindo a mim mesmo,

o carcereiro, o prisioneiro.

sábado, 13 de junho de 2015

O TEATRO EFÊMERO DA VIDA

 

O Teatro Efêmero da Vida


Eu me sento, espectador silencioso,

no grande palco do mundo.

As luzes mudam com o passar das horas,

o cenário, a cada estação.

E os atores, nós mesmos,

entram e saem de cena,

em um balé constante de chegadas e partidas.

É o teatro efêmero da vida.

 

Eu observo os figurinos, as máscaras,

as expressões que mudam a cada fala,

a cada passo.

Há o drama, a comédia, a tragédia,

tudo misturado em um enredo sem ensaio prévio.

As cortinas se abrem e se fecham,

e a cada ato, uma nova versão de nós surge,

moldada pelas experiências,

pelas dores, pelos amores.

 

Há cenas que eu gostaria de pausar,

de reviver em câmera lenta:

o riso que explodiu sem motivo,

o abraço que me aqueceu a alma,

o instante de revelação que mudou tudo.

E há outras que eu gostaria de apagar,

de reescrever,

mas o script não permite.

A vida segue seu curso imparável,

e nós, apenas interpretamos nossos papéis.

 

Eu sinto a fragilidade de tudo.

A beleza que desabrocha e fenece,

a voz que se cala,

o olhar que se perde no horizonte.

Mas também sinto a força da impermanência,

que nos ensina a valorizar cada aplauso,

cada silêncio,

cada respiração no palco.

 

E ao final do dia, quando as luzes diminuem,

e o palco se prepara para a próxima performance,

eu me levanto, talvez um pouco mais sábio,

um pouco mais consciente

de que sou parte dessa grande peça sem fim.

E a cada amanhecer,

a cortina se ergue novamente,

e eu estou pronto para o meu próximo ato,

nesse teatro efêmero e maravilhoso que é viver.