sexta-feira, 6 de junho de 2014

A EPIFANIA DO FIM DO VASTO

 

A Epifania do Fim do Vasto

O instante veio sem aviso, como a chegada de uma mosca, mas com o peso de um meteoro. Eu estava ali, debruçada sobre o parapeito da janela, ou talvez sobre a mesa de plástico de um café qualquer, onde o cheiro de café requentado pairava como uma névoa de rotina. Havia um prato à minha frente, vazio, e um copo com marcas de dedos. O mundo visível, com sua insistência teimosa, desenrolava-se lá fora: o ir e vir de pessoas que não me viam, o cinza exato do asfalto, o semáforo que mudava com uma regularidade exasperante.

 

E então, aconteceu. Aquele "eu" vasto, oceânico, que até então parecia conter constelações inteiras, abrigar silêncios que reverberavam em outros universos, sentir a dor de todas as existências passadas e a alegria de todas as futuras — esse "eu" começou a encolher. Não foi um colapso súbito, mas uma retração lenta, quase imperceptível, como a maré que recua e revela a areia antes submersa.

 

Aquele meu universo interior, antes ilimitado e feito de matéria onírica e de pensamentos que se gestavam em bolhas de ar e luz, de repente bateu nas paredes. Nas paredes lisas e inquebráveis do agora. Do concreto. Da voz do vendedor de pão, do choro de uma criança na rua, do tic-tac do relógio que me lembrava que o tempo, o tempo exterior, aquele que se mede e se gasta, continuava. Sem que eu pudesse fugir.

 

O assombro não era de terror, mas de uma compreensão gélida: toda aquela vastidão, toda a complexidade e os abismos que eu construíra dentro de mim, tudo aquilo esbarrava no pão, na conta de luz, na necessidade de respirar um ar que era o mesmo para todos. Minha alma, antes uma galáxia em expansão, sentiu-se aprisionada na caixa de um corpo, na dimensão exata de uma cadeira de plástico, na duração de um gole de água.

 

E a epifania se deu na desilusão singela: que o mais profundo de mim, o mais complexo e indizível, era, afinal, obrigado a se dobrar à simplicidade brutal do existir. Que o "eu" não era um universo autônomo, mas uma bolha frágil, flutuando à mercê do vento monótono do mundo, do mundo visível. E que a grandiosidade da minha consciência, por mais que se esforçasse, teria sempre de se encaixar nas gavetas apertadas do cotidiano. E isso, por um instante, foi insuportavelmente claro. E chato. E real.

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