sábado, 19 de junho de 2010

A CRONOLOGIA DA ALMA

 A Cronologia da Alma

 

Primeiro, veio o choro.

Água salgada esculpindo caminhos no rosto,

um dilúvio interno sem dique,

cada gota um adeus, uma ferida aberta

buscando um alívio que não chegava.

A garganta presa, o peito oco,

a pele viva, vibrando em dor.

 

Depois, o abismo se abriu.

Não era queda, mas dissolução,

um vazio que engolia cores e sons,

onde a gravidade da alma falhava.

Sem fundo, sem margem,

apenas a imensidão da ausência,

e a certeza fria de estar só

no vácuo do que se perdeu.

 

Então, veio o silêncio.

Não a ausência de som, mas a pausa

no grito, na vertigem.

Um manto pesado sobre tudo,

onde o eco das dores antigas

se tornava apenas um murmúrio distante.

Foi na quietude dessa suspensão

que o ar começou a entrar novamente,

sem pressa, sem alarde.

 

E, por fim, houve a cura.

Não um milagre instantâneo,

mas a trama paciente do tempo,

ponto a ponto, remendando o rasgado.

As cicatrizes, agora, são mapas,

testemunhos da travessia.

O choro se fez rio, o abismo, espaço,

o silêncio, canção nova.

A vida, outra vez,

pulsando na ressurreição.

 

quarta-feira, 16 de junho de 2010

AINDA PENSO

 Ainda Penso

 

 Em mim todas as consciências:

as ancestrais e as jovens.

Efêmeras.

Vêm e se abrem, e então

... o corte.

 

E a mesma mão que alcança,

é a que arranca.

Mas não penso que é o fim.

Não, jamais.

Porque mesmo na ausência,

no vazio deixado,

há o perfume.

Aquela memória olfativa,

a prova de que existiu,

de que marcou.

E como marcou.

 

Um rastro invisível

que se recusa a morrer no ar,

persistindo, insistindo.

Como se cada sopro me lembrasse:

fui, sou, serei,

mesmo sem estar.

 

É a eternidade do efêmero,

a presença da falta.

A vida,

em seu mais puro e

desconcertante estado de ser.

E mesmo assim

você não se importa.

terça-feira, 15 de junho de 2010

ÂNSIA DO VAZIO

 

A Ânsia do Vazio

 

E a ânsia do vazio, uma sede estranha

por aquilo que não tem forma, não tem som.

Não é medo do nada, é o acolhimento que se busca,

a promessa de um espaço onde a dor não ecoa,

onde a intensidade se dilui em silêncio puro.

 

É o chamado da ausência,

um convite para desaparecer,

para que o fio se desfaça de vez,

e a pressão ceda, e o peso se esvai.

O vazio, então, não é mais ameaça,

mas um refúgio, um ponto de fuga,

onde a existência se apaga

e finalmente se encontra a paz que a vida nega.

 

 

A Promessa do Vazio

 

E a promessa do vazio, uma melodia suave

que sussurra alívio onde antes só havia caos.

Não é uma ameaça, mas um convite,

a certeza de que, ao fim, tudo se dissolve,

e a pressão cessa, e o ruído se cala.

 

É o vislumbre de um descanso absoluto,

onde as perguntas se apagam sem respostas,

e os problemas se desfazem em nada.

O vazio, então, não é mais um abismo a ser temido,

mas um horizonte sereno,

onde a paz finalmente se instala,

uma calmaria sem fim para a alma exausta.

VAZIO POVOADO

 

Vazio Povoado

 

Um catálogo de vozes sem coro,

ecoando em salas de espelhos,

cada face uma emoção avulsa,

flutuando em ar denso.

 

Não há norte, nem a bússola cega

encontra repouso.

É o mar revolto dentro do peito,

ondas de riso, abismos de pranto,

todos quebrando na mesma costa.

 

São cores que se misturam sem ordem,

viram cinza, depois irrompem em festa,

um caos belo e exaustivo.

Sou o palco onde todas as peças

começam e terminam ao mesmo tempo.

 

E no fim, o silêncio que resta

é o som de todas as emoções

se abraçando em um único nó,

apertado, confuso, real.