A Cronologia da Alma
Primeiro, veio o choro.
Água salgada esculpindo caminhos no rosto,
um dilúvio interno sem dique,
cada gota um adeus, uma ferida aberta
buscando um alívio que não chegava.
A garganta presa, o peito oco,
a pele viva, vibrando em dor.
Depois, o abismo se abriu.
Não era queda, mas dissolução,
um vazio que engolia cores e sons,
onde a gravidade da alma falhava.
Sem fundo, sem margem,
apenas a imensidão da ausência,
e a certeza fria de estar só
no vácuo do que se perdeu.
Então, veio o silêncio.
Não a ausência de som, mas a pausa
no grito, na vertigem.
Um manto pesado sobre tudo,
onde o eco das dores antigas
se tornava apenas um murmúrio distante.
Foi na quietude dessa suspensão
que o ar começou a entrar novamente,
sem pressa, sem alarde.
E, por fim, houve a cura.
Não um milagre instantâneo,
mas a trama paciente do tempo,
ponto a ponto, remendando o rasgado.
As cicatrizes, agora, são mapas,
testemunhos da travessia.
O choro se fez rio, o abismo, espaço,
o silêncio, canção nova.
A vida, outra vez,
pulsando na ressurreição.