segunda-feira, 9 de junho de 2025

O VAZIO QUE FICA

 



O Vazio Que Fica

 

A presença da ausência é o que mata.

Não a lâmina, não o tiro,

mas o espaço que sobra

onde antes havia o corpo, a voz, o riso.

É a geometria distorcida de um ambiente

que se recusa a preencher

o contorno do que se foi.

 

É o ar pesado, denso,

nos lugares que você não ocupa.

O silêncio que se impõe

sobre a melodia que antes era sua.

É o quase toque na cadeira vazia,

a mão estendida que encontra apenas o nada.

A saudade ativa, pulsante,

que não é de lembrança, mas de falta concreta.

 

É o martelo do dia a dia

batendo na certeza do irrecuperável.

O travesseiro ainda marcado,

o café que esfria sem ser tocado.

Uma morte lenta e contínua,

diluída em cada objeto,

em cada canto da casa,

que grita o nome do que não está.

E a gente respira, come, dorme,

mas sabe que em alguma parte,

um pedaço essencial,

cessou de viver.

O ECO SEM VOZ

 


O Eco Sem Voz

 

A saudade que não faz barulho.

Ela não grita, não chora,

não rasga o tecido da noite.

É um sussurro etéreo,

um sopro morno

no avesso da alma.

 

Não há estampido, nem furor.

Apenas um ressonar subterrâneo,

como a maré que recua em silêncio

deixando a areia úmida.

Uma vibração sutil,

o zumbido de uma memória

que se recusou ao esquecimento,

mas que não pede palco.

 

É a presença da ausência

em sua forma mais pura.

Não a ferida aberta,

mas a cicatriz suave,

que a gente toca sem querer

e sente o relevo do que foi.

Uma melancolia aquietada,

que não exige prantos,

apenas o reconhecimento

de que algo existe,

e sempre existirá,

no fundo.

No lugar mais profundo

onde o som não chega,

mas a sensação permanece.

 

 

A RESSONÂNCIA SILENCIOSA DA SAUDADE

 



A Ressonância Silenciosa da Saudade

 

Também já senti essa saudade que não faz barulho. Não se manifesta em gritos ou lamentos, não se estraçalha em soluços. É uma saudade que se aloja em lugares ocultos, em câmaras secretas do peito, onde o som é desnecessário para que a presença seja sentida. Ela não pede passagem; simplesmente ressoa no fundo. Uma vibração quase imperceptível, como o tremor distante de um sino, que se espalha pelas veias e adentra os cantos mais remotos da alma.

 

É a ausência que se torna presente, mas não de forma dolorosa e aguda. É uma melancolia suave, um reconhecimento do que foi e já não é, sem que isso implique em desespero. Um aceno para a memória, sem a necessidade de reviver cada detalhe. Essa ressonância é o que nos lembra da complexidade do afeto, da forma como o tempo e a distância transformam a intensidade da falta em uma quietude que, paradoxamente, ecoa mais fundo do que qualquer clamor. É a saudade que se basta em si mesma, em seu silêncio profundo, porque o que foi vivido não precisa de alarde para continuar existindo em nós.

 

 

 

 

 

Explora esse mesmo tema acima em uma poesia lírica, moderna, sem rima e com título.

MÃOS: PARÁGRAFOS DE DESEJO

 

       

        Mãos: Parágrafos de Desejo

  

As mãos. Sempre as mãos. Não meras apêndices, mas ferramentas, sim, e fartas de desejos. Elas têm uma inteligência própria, um saber antigo que se recusa à lógica. Encaixam-se. Que verbo exato. Não "procuram encaixe", nem "tentam encaixar", mas simplesmente se encaixam. Em todas as suas reentrâncias, nos ângulos que a luz mal ousa tocar, nas medidas que a balança não pesa. Há uma precisão quase cruel nisso, uma certeza que assusta. Elas não tateiam; elas percorrem. Cada poro, cada pelo, cada sonho – e a gente se pergunta que sonhos são esses que se deixam percorrer assim, tão à vontade. E o mais assombroso: o interior das suas ranhuras. Que ranhuras são essas? As da pele, as da alma, as do tempo que se acumula?

 

Com essas ferramentas, sim, as mãos, eu me preparo. Um ritual. E me pego abestalhado pela descoberta. É sempre uma descoberta, não é? Mesmo quando se repete. A beleza, ela se revela em camadas, como as páginas de um livro que nunca se esgota. A beleza, que não é só o que se vê, mas o que se sente, o que se pressente. E a intenção, que surge quase sem querer: invadir-lhe os parágrafos. Não as páginas, não os capítulos, mas os parágrafos. Pequenos blocos de sentido, de vida. Eles, os parágrafos, me guiarão. Por onde? Pelo interior de novas palavras. E de palavras nascem frases, e as frases, elas não apenas contam, elas denunciam dicionários. Dicionários inteiros, com seus significados fechados, suas definições estreitas. As palavras, aqui, se libertam. E a gente se pergunta: que verdades serão essas que esses parágrafos, essas frases, esses dicionários denunciarão? E o que faremos com elas, uma vez que se revelem?

CADERNO DA MISERICÓRDIA II

 




Caderno da Misericórdia II

Epígrafe
"Senhor, tende piedade, e fazei brilhar a vossa luz em nossas sombras."

Sumário

Parte I — Kyrie Eleison
Parte II — Christe
Parte III — Nocturnus
Parte IV — Glória do Perdão
Parte V — Lumina
Parte VI — Misericórdia
Parte VII — Cântico dos Perdoados
Parte VIII — O Refúgio
Parte IX — Horizonte de Esperança
Parte X — Chama Viva
Parte XI — Abraço de Fogo
Parte XII — Confiança Renovada
Parte XIII — Presença Divina
Parte XIV — Rio de Misericórdia
Parte XV — Esperança Viva
Parte XVI — Chama de Fé
Parte XVII — Caminho da Paz
Parte XVIII — Abraço Consolador
Parte XIX — Refúgio da Alma
Parte XX — Reino da Misericórdia
Parte XXI — Cântico da Esperança


Parte I — Kyrie Eleison

Senhor, tende piedade,
Mesmo quando o coração falha,
Tua misericórdia é abrigo,
Sopro que acalma a alma cansada.


Parte II — Christe

Ó Cristo, luz em meio à dor,
Confiança que nunca esmorece,
Mesmo nas noites mais escuras,
Tua graça renova e aquece.


Parte III — Nocturnus

Nas sombras, teu rosto busco,
Silêncio que sussurra esperança,
Mesmo em pranto e solidão,
Teu amor é presença constante.


Parte IV — Glória do Perdão

Na entrega, encontro alívio,
No perdão, renasce a vida,
Tua glória, Deus misericordioso,
Transcende toda a ferida.


Parte V — Lumina

Luz que rompe a escuridão,
Clareia o caminho sofrido,
Em cada passo, tua mão,
Guia o espírito rendido.


Parte VI — Misericórdia

Fonte viva que não seca,
Rio que lava o pecado,
Teu amor, eterna promessa,
Abraça o ser fragilizado.


Parte VII — Cântico dos Perdoados

Cantam os corações libertos,
Em notas de pura gratidão,
Pois quem é tocado por tua paz,
Floresce em plena renovação.


Parte VIII — O Refúgio

Abrigo seguro na tormenta,
Fortaleza onde posso descansar,
Em ti, encontro calmaria,
Paz que ninguém pode tirar.


Parte IX — Horizonte de Esperança

Além da dor, há um amanhecer,
Cores que pintam a promessa,
Tua misericórdia me sustenta,
Firmando minha leveza.


Parte X — Chama Viva

Fogo que arde sem consumir,
Luz que aquece o coração,
Em teu abraço, chama viva,
Renovo e redenção.


Parte XI — Abraço de Fogo

Teu amor que incendeia a alma,
Purifica o que há de velho,
No abraço que tudo transforma,
Descanso e zelo.


Parte XII — Confiança Renovada

Mesmo quando o céu desaba,
Firmo os pés na tua palavra,
Confiança que se renova,
No abraço que nunca se acaba.


Parte XIII — Presença Divina

Tua luz brilha no silêncio,
Companhia que não se ausenta,
No íntimo do meu ser,
Tua paz é a maior semente.


Parte XIV — Rio de Misericórdia

Águas puras que descem suaves,
Lavando as marcas da dor,
Neste rio encontro vida,
Fonte eterna de amor.


Parte XV — Esperança Viva

No horizonte que desponta,
Surgem cores de novo dia,
Tua promessa me sustenta,
Vive em mim a alegria.


Parte XVI — Chama de Fé

Fogo que aquece e ilumina,
Sem jamais se apagar,
A fé que em meu peito habita,
Me ensina a caminhar.


Parte XVII — Caminho da Paz

Passo a passo, em tua luz,
Vou trilhando sem temer,
No caminho que conduz,
O descanso a florescer.


Parte XVIII — Abraço Consolador

Quando o pranto quer vencer,
Teu abraço me envolve, enfim,
Sopro suave que me traz,
Calma, vida e jardim.


Parte XIX — Refúgio da Alma

Em ti encontro morada,
Lugar seguro e sagrado,
És porto e calmaria,
Meu descanso abençoado.


Parte XX — Reino da Misericórdia

Em teu reino sem fim,
Reina amor e compaixão,
Sou filho e herdeiro,
Da eterna redenção.


Parte XXI — Cântico da Esperança

Canto que não se cala,
Mesmo na dor e na prova,
Esperança que avança,
Na alma que se renova.





domingo, 8 de junho de 2025

PRA FICAR ANÔNIMO

 

PRA FICAR ANÔNIMO

 

como qualquer um que sonha

que aspira momentos de clareza

tendo contudo momentos de confusão

como qualquer outro ser

que anda e pensa

e compartilha segredos de amigos

amores

ilusões

que dá risadas e aplaude de pé

também me rendo diante daquilo

que costuma me provocar

daquilo que move em mim

alguns questionamentos

tão sem importância

tão importantes

tão confiantes.

 

como qualquer outro

que não se importa em parecer piegas

despretensioso

eu procuro me importar

com os seus detalhes

seus calçados

seus cuidados entrelaçados

de carinhos

vontades

e mãos apressadas.

 

por isso

não preciso refazer-me a cada dia

todo dia

em mínimos brotares de

desconfianças

porque te abraço ainda mais

por saber que logo ali

após os primeiros sinais

para que o dia amanheça

começa nossa caminhada

de fazer suar frio

e não deixar

que essa paixão transpareça.

 

sábado, 7 de junho de 2025

SEM VOLTA

 

SEM VOLTA

 

nenhum recado

nada de e-mail

ou carta

ou bilhete.

nada que preencha espaços

com letras

ou palavras

ou sinais de fumaça

ou de tambores.

ou repiques agudos

de tarol

ou caixa-de-guerra

nada mesmo

que faça lembrar

as tantas promessas

que surpreendiam

pelas ousadias.

 

que viesse ao menos

um mísero pombo-correio

com uma pequena mensagem

ainda que passageira

ainda que ilusória

ainda que transitória

uma única palavra

que externasse

a vontade de mostrar

a mim

que eu poderia ter esperança

porque todos aqueles momentos

passados

esquecidos

amarelecidos

poderiam

ser revividos.

 


O PONTO SUB-ZERO

 


O Ponto Sub-Zero

Eu vislumbro um ponto sub-zero, onde o tempo ainda não germinou, e o espaço, um mero pressentimento. É o abismo antes do vazio, a quietude antes do nada.


Ali, onde a lógica se desfaz, e a existência é apenas uma sombra, o potencial reside. Não há luz, nem som, nem forma, apenas a promessa de tudo o que pode ser.


É o limiar do inexplicável, o berço mudo da criação, de onde emergem os mundos, as canções não cantadas, os sonhos ainda não sonhados. Neste ponto sub-zero, sou a essência, antes da forma.


O ENCONTRO

 



O Encontro

 

É a névoa que desce na cidade,

suave como um véu de gás,

mas densa o suficiente

para apagar os faróis distantes,

e nos fechar num casulo úmido.

 

É o toque da mão amada,

suave no dorso, um carinho,

mas a presença é densa,

um peso bom no ar,

que preenche cada fresta do existir.

 

É a batida do jazz no fone,

suave no grave que rola,

mas a melancolia é densa,

envolve o corpo, vira nuvem

e chove lá dentro.

 

É o tempo, escorrendo como areia,

suave entre os dedos, imperceptível,

mas a soma dos dias é densa,

uma rocha invisível,

que molda o que fomos e o que seremos.

 

Em cada interstício do mundo,

entre o toque leve e a presença forte,

a respiração que se expande

e o peso do silêncio que comprime,

reside o paradoxo:

ser leve e pesado,

flutuar e fincar raízes.

Sempre suave e denso,

como a vida em si mesma.

O PERFUME DO VAZIO

 



O Perfume do Vazio

 

Não é jasmim, nem café fresco.

É um rastro invisível,

mas presente.

O cheiro da ausência que permeia.

 

Gruda nas cortinas,

no travesseiro ainda marcado.

No silêncio que antes era riso,

agora é apenas o ar pesado.

 

É um armário vazio,

com a fragrância fantasma

da camisa que não está lá.

Uma xícara esquecida na pia,

sem o vapor, sem a rotina.

 

Ele se mistura ao pó nos móveis,

à luz que bate na parede

onde a foto não foi pendurada.

É a nota que falta no acorde,

a palavra que não se disse,

mas que ainda vibra na língua.

 

Não dá para lavar,

nem ventilar para fora.

O cheiro da ausência que permeia

é a memória que respira,

um fantasma olfativo

que te envolve, suave e denso,

no espaço que um dia foi cheio.