segunda-feira, 16 de junho de 2025

O REFLEXO INVERTIDO

 

O Reflexo Invertido

Meu espelho agora começou a me observar quando eu o encaro.
Não com olhos,
mas com uma paciência que eu nunca tive comigo.

Ele espera que eu me canse das perguntas,
para devolver a que sempre esteve ali,
sob a pele, sob o disfarce,
sob o riso educado que ofereço ao mundo.

Ele sabe dos silêncios que ensaio,
dos gestos que desisto antes de completar,
das palavras que morrem na boca
para que o dia siga em paz.

E, quando eu o encaro,
não vejo mais o contorno do meu rosto,
mas um cansaço antigo —
que não me pertence só a mim.

Há alguém dentro do espelho
me pedindo escuta.
Alguém que carrega os dias que enterrei às pressas,
as vidas que deixei passar por não saber nomeá-las.

O reflexo agora me devolve histórias.
Mas não como um álbum —
como um sussurro do tempo
que passou sem despedida.

Eu não me olho mais para me ver,
mas para que o espelho me diga
quem fui
quando não me reconhecia.

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