segunda-feira, 9 de junho de 2025

MÃOS: PARÁGRAFOS DE DESEJO

 

       

        Mãos: Parágrafos de Desejo

  

As mãos. Sempre as mãos. Não meras apêndices, mas ferramentas, sim, e fartas de desejos. Elas têm uma inteligência própria, um saber antigo que se recusa à lógica. Encaixam-se. Que verbo exato. Não "procuram encaixe", nem "tentam encaixar", mas simplesmente se encaixam. Em todas as suas reentrâncias, nos ângulos que a luz mal ousa tocar, nas medidas que a balança não pesa. Há uma precisão quase cruel nisso, uma certeza que assusta. Elas não tateiam; elas percorrem. Cada poro, cada pelo, cada sonho – e a gente se pergunta que sonhos são esses que se deixam percorrer assim, tão à vontade. E o mais assombroso: o interior das suas ranhuras. Que ranhuras são essas? As da pele, as da alma, as do tempo que se acumula?

 

Com essas ferramentas, sim, as mãos, eu me preparo. Um ritual. E me pego abestalhado pela descoberta. É sempre uma descoberta, não é? Mesmo quando se repete. A beleza, ela se revela em camadas, como as páginas de um livro que nunca se esgota. A beleza, que não é só o que se vê, mas o que se sente, o que se pressente. E a intenção, que surge quase sem querer: invadir-lhe os parágrafos. Não as páginas, não os capítulos, mas os parágrafos. Pequenos blocos de sentido, de vida. Eles, os parágrafos, me guiarão. Por onde? Pelo interior de novas palavras. E de palavras nascem frases, e as frases, elas não apenas contam, elas denunciam dicionários. Dicionários inteiros, com seus significados fechados, suas definições estreitas. As palavras, aqui, se libertam. E a gente se pergunta: que verdades serão essas que esses parágrafos, essas frases, esses dicionários denunciarão? E o que faremos com elas, uma vez que se revelem?

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