sábado, 22 de maio de 2021

VENTO ENTRE PRÉDIOS

 

Vento entre Prédios

escapo pelo vão
onde o concreto se dobra
e o vento sussurra histórias
que o cimento esqueceu

ele dança leve,
quase invisível
entre muros altos
que tentam calar o céu

carrega o cheiro da chuva
o eco dos passos apressados
e leva embora o calor
que a cidade tenta prender

no vento entre prédios
encontro liberdade
mesmo cercado de aço,
me sinto um pássaro
que aprende a voar no silêncio

e assim, respiro fundo
e deixo que o vento leve
o que não preciso guardar

NO SINAL VERMELHO DO DESTINO

 No Sinal Vermelho do Destino

Parei no tempo
num instante suspenso
onde o mundo hesita
antes do próximo passo

o sinal vermelho
não é só cor
é uma pausa
entre o querer e o ser

é o silêncio que grita
na espera impaciente
um convite para olhar
para dentro

ali, no meio da rua
entre buzinas e sonhos
aprendi que o destino
não é linha reta

é curva, é breque
é escolha feita
no compasso da espera

e mesmo parado,
sei que caminho —
porque a vida acontece
no entretempo

LUZES DE CONCRETO

 

Luzes de Concreto

A cidade acende
antes do sol sumir
como quem tem medo
do escuro de si mesma

faróis piscam como corações
em estado de urgência
e as janelas brilham
feito promessas adiadas

há beleza
no aço que respira
na pressa que também ama
nos passos que se cruzam
sem saber os nomes

sou feito de calçadas
que ouviram confissões
e de postes que vigiaram
minhas noites mais densas

mas mesmo entre muros
e buzinas e fumaça
a vida insiste
em florescer rachaduras

as luzes de concreto
não aquecem a pele
mas acendem
alguma fé
de que ainda é possível

domingo, 9 de maio de 2021

VEM

 

VEM

e a timidez se fez presente,
a te deixar envergonhada
por estar diante das lentes
do meu cristalino,
que desnudavam tuas curvas
enquanto minhas mãos desprendiam,
de teus ombros, as alças
do vestido de algodãozinho.

não parecias saber o que fazer,
o que dizer,
a não ser o natural fechar de pernas,
cobrir os seios com as mãos
e deixar-se submissa,
ser acariciada.

a pele,
porém,
denunciava o desejo quase incontido
de dar-se,
para que corpo se confundisse
com corpo,
para que os movimentos
eternizassem o momento.

costas apoiadas nos lençóis,
olhos semicerrados,
a divisar-me na chegança do bem —
e nada podias dizer
mais lindo e sublime
que o teu desajeitado:
vem.

sábado, 16 de janeiro de 2021

EU NÃO SABIA

EU NÃO SABIA QUE SERIA ASSIM 


Essa tristeza. Não é o frio repentino do susto, nem a pontada aguda da dor. É um peso. Morno. Instalado bem no centro do peito.

Não aperta, não sufoca de repente. Apenas está lá. Como uma pedra lisa aquecida pelo sol, mas que nunca arrefece.

É uma sombra. Mas não a sombra que se alonga ao entardecer, ou que desaparece ao meio-dia.

Essa sombra não se move. Quando a luz do sol gira, quando as lâmpadas se acendem, quando o dia vira noite, ela permanece no mesmo lugar.

Fixa. Ancorada em mim.

Não é o reflexo de algo externo, não é projetada por um obstáculo visível. É a sombra da minha própria paisagem interna, projetada para dentro.

Um peso morno. Uma sombra imóvel. No centro do peito. A tristeza que não sai, que não muda com a luz, apenas habita, silenciosamente, constantemente, em mim.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

O CHAMADO

 

O Chamado Silencioso do Desconhecido

Um sussurro na brisa, um tom que a memória não alcança, mas a pele arrepia em presságio.

Que mistério reside na curva da estrada, no eco distante de um sino?

O olhar se perde em tons de um azul indecifrável, onde o céu encontra a montanha e segredos se aninham.

Um vermelho pulsante na flor silvestre, uma promessa vibrante, um instante de pura entrega.

O farfalhar das folhas, uma conversa antiga, palavras que o vento traduz em canções efêmeras.

E a pergunta teima, insistente e suave, qual o nome desta saudade que o desconhecido me traz?

Será um portal aberto para um tempo esquecido, ou apenas a dança fugaz de sombras e luz em meu sentir?

O desconhecido chama, não com voz audível, mas com a força sutil de um imã na alma. E a exploração começa no território incerto das próprias sensações.