quarta-feira, 22 de maio de 2024

AS RUAS QUE ME INVENTAM

 

As Ruas que Me Inventam

Caminho sem pressa
pelas esquinas do acaso
onde o concreto conta histórias
e o vento sussurra segredos

cada rua tem um nome
e uma memória solta
um riso perdido
uma sombra que dança

sou feito do que andei
do que deixei para trás
das portas que não bati
e das que se abriram sem aviso

nessas ruas encontro
fragmentos de mim mesmo
no olhar do desconhecido
no passo apressado

não busco destino
mas me deixo inventar
a cada esquina,
a cada passo,
uma nova versão de mim

segunda-feira, 20 de maio de 2024

NO LABIRINTO DE ESPELHOS

 

No Labirinto de Espelhos

No centro do silêncio,
o tempo não corre.
Ele se quebra —
como vidro sob pressão invisível.

Espelhos por toda parte,
não refletem o que fui,
mas o que poderia ter sido
em infinitas versões de mim.

Os relógios,
pendurados no ar rarefeito,
não tique­tacam,
não avançam —
são testemunhas estáticas
de um agora que se alonga
como uma respiração contida.

Teus olhos,
não janelas,
mas portais.

Mergulhei.

Não houve som, nem resistência.
Apenas o cair —
leve e definitivo.

Ali,
sob o vidro líquido do teu olhar,
cresciam cidades invisíveis,
estradas feitas de intuição,
mares sem bússola
onde navegar era lembrar.

Nesse mundo novo,
o amor
não era susto,
nem faísca,
mas gravidade.
Uma lei inevitável,
calma e total.

Perdi-me.
Ou talvez me desfiz
das margens.

E no azul sem contorno,
soube:
pertencer
é deixar de procurar saída.

domingo, 19 de maio de 2024

O DIA EM QUE DESISTI DE ENTENDER

 O DIA EM QUE DESISTI DE ENTENDER

achei que amor era fórmula
que bastava seguir as instruções

mas você veio com perguntas demais
e respostas de menos

e algo em mim —
muito mais teimosia do que razão —
começou a escutar

escutei a dor sem nome
o cansaço sem fala
a verdade que não pede licença

então larguei o manual
e fui com você
cruzar a rua
sem rumo
sem certeza

e de repente
o centro da cidade
virou o centro de tudo

e o amor
não precisou mais
ser explicado.

MAPA TÁTIL

 

MAPA TÁTIL

entendi tudo
no momento em que tua mão
não desviou

ficou
respondeu sem palavras
o que minha boca nunca ousou dizer

foi um toque calmo
um gesto sem roteiro
mas com a força de um poema

teu gesto desenhava em mim
um mapa secreto
com ruas que levavam ao mesmo lugar

e quando nos vimos
presas um do outro
nesse labirinto de pele e intenção
sabíamos:
era ali que se morava

nossos olhos —
duas janelas escancaradas
por onde passavam
todas as verdades
que o toque traduziu.

quinta-feira, 9 de maio de 2024

NOVA VESTIMENTA

NOVA VESTIMENTA 

o suor que foi gasto
e derramado
em tão pouco tempo
teve o dom de vestir em nós,
em nossos poros,
a mais linda roupagem,
o mais belo manto,
o mais brilhante
e ajaezado costume,
batizando-nos corpo
e coragem.

cumplicidade feita
de vai-e-vens,
olhos e espelhos,
num jogo de sedução
e descobertas.

alguns sons de outros tempos
ressoando
em lembranças vagas,
alavancando sonhos.

vestidos de suores,
iniciamos outra história,
outras tantas esperanças,
no dia em que o gozo
alcançou a glória.

terça-feira, 19 de dezembro de 2023

ANTROPOLOGIA URBANA

 

ANTROPOLOGIA URBANA

ela não anda —
declara a rua com os quadris
faz do salto
um hino de resistência estética

é pré-histórica e pós-futurista
na mesma passada

quem a viu sabe:
ela é tese e mito
é o elo entre o sagrado e o suspiro

nuvem de perfume e pulso
passando diante de prédios ocos
como se fossem ruínas de um mundo
que ainda não soube
como olhá-la direito.

domingo, 8 de outubro de 2023

HORIZONTE DE ESPERANÇA

 

Horizonte de Esperança

no fim do olhar cansado
uma luz se acende
sutil, insistente
promessa de manhã

é linha tênue
entre o hoje e o amanhã
onde o sonho se encontra
com a coragem de ser

não é fuga, nem ilusão
mas passo firme
sobre a areia movediça
dos dias difíceis

o horizonte sorri
mesmo quando escurece
e revela que sempre há
um motivo para seguir

pois onde há esperança
floresce a vida
e nasce um novo dia

terça-feira, 19 de setembro de 2023

GEOGRAFIA DO DESEJO

 

GEOGRAFIA DO DESEJO

há uma topografia secreta
no modo como teus lábios
cartografam minha pele

não é pressa —
é percurso.

as mãos, bússolas febris
desenham trilhas
onde antes só havia espera

teu hálito,
vento quente de monções
move cortinas internas
abre portos esquecidos

os músculos se lembram
da língua como seta
da saliva como selo

não há nome para o que se dá
sem pedir,
sem recuar —
mas sabemos.

os corpos, rios que se encontram,
perdem-se em curvas
em fundos não mapeados
em sinuosidades novas
onde o prazer não é fim
mas fenda,
criação,
caminho aberto.

segunda-feira, 19 de junho de 2023

CORRENDO EM CÍRCULOS

 

 

Correndo em Círculos

 

O caminho se repete,

o mesmo passo, a mesma pedra,

embora o cenário mude

no labirinto da cabeça.

 

As ideias voltam,

ecos de ecos,

perguntas antigas

sempre à tona,

uma fita rebobinando

o que nunca teve fim.

 

É o tic-tac da dúvida

que não se cala,

o compasso do ser

preso em sua própria jaula

de vidro transparente,

onde a saída é sempre a entrada.

 

Canso de girar em torno do mesmo,

de buscar o nó

que desata a alma,

mas encontro apenas o começo

de um novo e idêntico amanhecer.

 

E neste eterno retorno,

a única certeza

é o movimento circular,

a infinita dança

que me leva de volta

ao ponto exato

onde nunca estive.

 


 

 

quarta-feira, 24 de maio de 2023

PALAVRA PRESA

 PALAVRA PRESA

 

Esse nó na garganta, apertado e cruel,

Sufoca a voz, a fala, o pensamento.

Um peso imenso, que se faz implacável,

Em silêncio rouba a paz e o contentamento.

 

A palavra presa, em vão tenta escapar,

Mas a angústia a prende, em sua teia escura.

Um turbilhão de emoções, que se amontoam,

E a alma se debate, em sofrimento puro.

 

Lágrimas contidas, um oceano calado,

Que inunda o peito, com sua dor profunda.

A solidão se instala, em seu reino sagrado,

 

E a esperança se esvai, como fumaça efêmera e munda.

Só resta a espera, paciente e sem alívio,

Que esse nó se desfaça, em suave derretimento