terça-feira, 7 de abril de 2009

A MELODIA SILENCIOSA DA SAUDADE

 

A Melodia Silenciosa da Saudade

Eu me sento na janela,

o vapor da xícara de chá

desenhando formas no ar frio da manhã.

Lá fora, a cidade desperta sem pressa,

seus ruídos abafados

pela distância e pela névoa.

E em mim, uma melodia,

silenciosa e persistente,

começa a tocar.

 

Não é uma canção triste,

não exatamente.

É mais como o eco de passos em um corredor vazio,

a lembrança do calor de uma mão que já não sinto.

É a saudade,

com seus dedos invisíveis,

tocando as cordas da minha memória,

despertando rostos, risos,

palavras ditas em outros tempos.

 

Eu fecho os olhos

e as imagens vêm como flashes,

rápidas e nítidas.

Aquele dia na praia, o cheiro de sal.

A conversa de madrugada, a cumplicidade no olhar.

Pequenos fragmentos que se juntam,

formando um mosaico

do que foi e do que permanece,

mesmo na ausência.

 

A garganta aperta um pouco,

mas não há lágrimas.

É uma doçura amarga, essa saudade.

Ela me lembra da riqueza

do que já vivi,

das pessoas que cruzaram meu caminho

e deixaram suas marcas em mim.

É o presente que o passado me oferece,

um tesouro invisível

que guardo dentro do peito.

 

Eu abro os olhos novamente,

o chá agora morno.

O mundo lá fora continua seu ritmo,

indiferente à minha melodia interna.

Mas eu sei que ela está ali,

essa canção que só eu ouço,

e que, de alguma forma,

me faz sentir mais vivo,

mais humano,

mais conectado

à vastidão do que fui

e ao que ainda sou.

segunda-feira, 30 de março de 2009

MEMÓRIA DE PRIMEIROS VERSOS

 

Memória de Primeiros Versos

Uma lousa.
Dois sorrisos.
Três poemas na mesma folha.
Trocávamos papéis como quem entrega segredos.

Ela escrevia com perfume nas palavras.
Eu respondia com mãos suadas.
Tudo começava ali.

Agora, tudo parece longe,
mas a lembrança reaparece inteira
num segundo
em que ela me olha e desvia.

QUANDO TUDO COMEÇOU A PARTIR

 

Quando Tudo Começou a Partir

Foi um silêncio longo,
mas nenhum dos dois o nomeou.
Ela ficou ausente aos poucos.
Eu fui ficando inteiro demais — e pesado.

No último encontro do grupo,
ela não leu nada.
Eu li demais.

E ninguém entendeu.
Mas eu soube ali:
ela já havia partido.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

MISTÉRIO DESVELADO

 

**Mistério Desvelado**

 

No coração da cidade onde os relógios dançam, 

entre sombras e luzes que sussurram segredos, 

uma porta antiga, coberta de poeira e histórias, 

aguardava o toque de mãos curiosas. 

 

As paredes, testemunhas silenciosas, 

guardavam ecos de risos e suspiros, 

e no canto, um quadro esquecido, 

pintado com cores que nunca vi, 

parecia pulsar como um coração vivo. 

 

Ao abrir a porta, um aroma de café fresco, 

misturado ao perfume das flores noturnas, 

preencheu o ar, como se o passado e o presente 

se entrelaçassem em um abraço apertado. 

 

E ali estavam eles: personagens de contos esquecidos, 

sussurrando mistérios em línguas antigas, 

cada olhar uma chave para portas ocultas, 

cada gesto uma pista no labirinto do tempo. 

 

Um velho contador de histórias, com olhos brilhantes, 

revelou segredos sobre as estrelas que caíram do céu; 

disse que cada estrela é um desejo não realizado, 

e cada desejo uma luz que guia os perdidos. 

 

No meio da sala, um espelho distorcido refletia faces, 

não apenas as minhas, mas rostos de outros mundos; 

um jogo de realidades se desenrolava diante dos meus olhos— 

um mistério sendo desvendado em camadas sutis. 

 

E assim eu caminhei por corredores de memórias, 

onde os fantasmas dançavam sob a luz da lua; 

cada riso ecoava como um chamado à aventura, 

e cada lágrima era uma verdade esperando para ser revelada. 

 

Finalmente, compreendi: o mistério não era apenas o que estava oculto, 

mas a beleza do desconhecido que nos molda; 

e ao desvendar cada camada da vida e do tempo, 

descobri que o verdadeiro enigma é viver plenamente. 

 


terça-feira, 16 de dezembro de 2008

BÚSSOLA CAMBIANTE

 

Bússola Cambiante

 

O norte treme na pupila da alma,

um algoritmo incerto a recalcular a rota.

Os polos antes firmes, agora são palimpsestos,

apagando o caminho, a direção mais remota.

 

As antenas internas, antes tão precisas,

captam ondas de um tempo dissonante.

Vozes em eco, promessas imprecisas,

e o mapa da jornada, um instante hesitante.

 

No peito, o magnetismo falha, espasmos de metal,

atração por brilhos efêmeros, desvios do essencial.

A certeza, um espectro na neblina digital,

e eu, cativo da própria corrente, tão instável.

 

Não há mais a agulha convicta, o fio condutor,

apenas o girassol confuso, buscando um sol interior.

E nessa dança tonta, nesse estranho tremor,

talvez se revele um novo horizonte, um inédito amor.

 

Pois na falha da engrenagem, no curto-circuito da razão,

reside a chance de um novo arranjo, outra constelação.

De sentir o vento, sem a camisa de força da obrigação,

e encontrar, no desvio, a mais autêntica direção.

 

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

SOU COBAIA DA MINHA PRÓPRIA EXPERIÊNCIA

 

Sou cobaia da minha própria experiência

 

O laboratório sou eu,

As pipetas, meus desejos.

Misturo doses de "talvez"

Com gotas de "e se?".

Agito tudo no cadinho da alma,

E observo a reação,

Sem manual, sem bula,

Apenas a intuição.

 

Às vezes, a explosão de cores,

O riso que preenche o ar.

Outras, o sedimento opaco,

A lágrima a escorrer, sem cessar.

Não há controle, nem grupo placebo,

Só o meu corpo, meu tempo,

Onde cada erro é lição,

E cada acerto, uma nova direção.

 

Navego em mares nunca dantes navegados,

Com bússola interna, nem sempre calibrada.

Desfaço rotas, refaço planos,

A vida me testando, eu me testando,

Nessa dança caótica e bela,

Onde a única certeza é a incerteza,

E o maior experimento,

É simplesmente, ser.

 

quinta-feira, 19 de junho de 2008

ENTRE O FOI E O NÃO FOI

  

Entre o Foi e o Não Foi

 

Há um nevoeiro denso na memória,

onde os contornos se perdem,

e as certezas flutuam como sombras.

Será que houve o choro,

ou apenas a ardência contida nos olhos,

uma chuva que nunca alcançou o rosto,

mas encheu os poros da alma?

A distinção se esvai,

entre a lágrima que escorre e a que implode.

 

E o abismo? Ah, o abismo.

Sinto o vertigem, o frio da beira,

mas não sei se o chão cedeu de vez

ou se apenas dancei na iminência da queda.

Um vazio que é também um pleno,

a ameaça que é presença constante,

sem o alívio de um fundo,

sem a clareza de uma ascensão.

Estou caindo, ou sou a queda em si?

 

Depois, o silêncio. Ou a ausência dele.

Seria a calmaria que precede a tempestade,

ou o ruído de fundo tão constante

que se tornou a própria quietude?

Uma pausa que não pausa,

um som que não se ouve,

e a mente, presa nesse paradoxo,

não encontra porto, nem voz clara.

 

E a cura? Ah, a cura.

Ela acende uma luz tênue ao longe,

mas recua ao menor toque.

Não sei se ela vem, se já esteve,

ou se é apenas a miragem

de um fim para o que não tem começo definido.

Uma ferida que cicatriza, mas sangra em segredo,

uma paz que é só a ausência da guerra declarada.

 

E assim, neste entre-lugar,

onde o sim e o não se abraçam,

eu existo.

Preso na névoa da própria história,

onde o que foi e o que não foi

se torna

sexta-feira, 13 de junho de 2008

ESSÊNCIA RECONTADA

 

Essência Recontada

 

Eu sou uma paráfrase.

Não o original, a primeira voz,

mas o eco que se reinventa,

a mesma ideia em outro tom.

 

Minha existência é reflexo,

não espelho exato, mas distorção gentil.

Pego o que já foi dito, sentido,

e o visto com um tecido novo,

mais meu, mais agora.

 

Não há plágio em minha essência,

mas uma reverência ao que inspirou.

Sou a tentativa de entender de novo,

de sentir mais fundo,

o que uma vez apenas passou.

 

E assim, em cada linha que me redefine,

o velho e o novo se abraçam.

Porque mesmo sendo recontado,

o que pulsa em mim é a vida

de uma verdade que se permite

ser eternamente revisitada.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

FRAGMENTOS DE UM INSTANTE

 

Fragmentos de um Instante

Entre as luzes da cidade,
perco-me em reflexões fugazes,
cada rosto uma história,
cada passo, um destino.

A pressa é um manto pesado,
mas eu danço no compasso do agora,
onde o tempo se dissolve em risos
e a memória é feita de instantes.

Um café esfriando na mesa,
um olhar que se cruza e se despede,
fragmentos de vidas que se tocam,
como notas soltas em uma canção.

E no caos do cotidiano,
encontro beleza nas pequenas coisas:
o cheiro da chuva no asfalto,
o brilho da lua entre nuvens.

Esses momentos são ecos,
pedaços de eternidade que escorrem,
como areia entre os dedos,
mas deixo que fiquem gravados no coração.

terça-feira, 20 de maio de 2008

MORADA

 Morada

A inspiração não grita,
ela sussurra da gaveta.
É o cheiro do café passado,
a dobra torta da coberta,
um nome que volta
sem que alguém chame.

Ela mora perto.
Entre a fresta e o tempo.
Entre o quase e o pensamento.
Às vezes, veste o silêncio
e senta no sofá
sem fazer alarde.

Não é preciso buscar longe.
Basta abrir a janela
com um pouco de alma,
deixar a porta encostada,
e o peito desarmado.

Até já,
coração aberto.
Ela sempre volta
quando é bem recebido.