sábado, 13 de junho de 2015

O TEATRO EFÊMERO DA VIDA

 

O Teatro Efêmero da Vida


Eu me sento, espectador silencioso,

no grande palco do mundo.

As luzes mudam com o passar das horas,

o cenário, a cada estação.

E os atores, nós mesmos,

entram e saem de cena,

em um balé constante de chegadas e partidas.

É o teatro efêmero da vida.

 

Eu observo os figurinos, as máscaras,

as expressões que mudam a cada fala,

a cada passo.

Há o drama, a comédia, a tragédia,

tudo misturado em um enredo sem ensaio prévio.

As cortinas se abrem e se fecham,

e a cada ato, uma nova versão de nós surge,

moldada pelas experiências,

pelas dores, pelos amores.

 

Há cenas que eu gostaria de pausar,

de reviver em câmera lenta:

o riso que explodiu sem motivo,

o abraço que me aqueceu a alma,

o instante de revelação que mudou tudo.

E há outras que eu gostaria de apagar,

de reescrever,

mas o script não permite.

A vida segue seu curso imparável,

e nós, apenas interpretamos nossos papéis.

 

Eu sinto a fragilidade de tudo.

A beleza que desabrocha e fenece,

a voz que se cala,

o olhar que se perde no horizonte.

Mas também sinto a força da impermanência,

que nos ensina a valorizar cada aplauso,

cada silêncio,

cada respiração no palco.

 

E ao final do dia, quando as luzes diminuem,

e o palco se prepara para a próxima performance,

eu me levanto, talvez um pouco mais sábio,

um pouco mais consciente

de que sou parte dessa grande peça sem fim.

E a cada amanhecer,

a cortina se ergue novamente,

e eu estou pronto para o meu próximo ato,

nesse teatro efêmero e maravilhoso que é viver.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

O VOO QUE NÃO É VOO

 

 O Voo que Não É Voo

 

A saudade, sorrateira.

Não a que se chora, mas a que se finca.

Um andaime espetado em plena avenida,

nas minhas veias,

nas minhas artérias dilatadas.

Que estranha arquitetura é essa que se constrói dentro de mim?

 

Sua voz, um eco que se recusava a ser calado,

diria: "Volta."

Uma palavra. Um abismo.

Uma ordem que não se ordena.

E a gente obedece. Por que?

 

Sem perceber as implicações.

A intenção do carinho, essa armadilha sutil.

Que muda a gente, sem a gente querer.

Que tece outra trama, outro destino.

E de repente,

eu, o que fugia, o que se esquivava,

percebi-me:

malas na mão,

naquele imenso saguão.

Um lugar de partidas e de chegadas,

mas que para mim, era apenas um limbo.

Aguardando a aeronave.

Que me aproximaria.

De você.

Mas de que forma?

Em qual tempo?

Essa aproximação, não é um ir.

É um deixar-se levar, para onde?

Para o assombro do que virá?

Ou para a perplexidade do que já se foi?

domingo, 24 de maio de 2015

DE QUEM JÁ PASSOU E DEIXOU MARCAS

 

De quem já passou e deixou marcas

Nem tudo vai embora
quando parte.
Há presenças que ficam
na ausência.
Rastros sutis
que o tempo não apaga,
só acomoda.

De quem já passou,
ficou o cheiro em certas horas,
uma música que não toca igual,
o jeito de olhar o mundo
com um pouquinho mais de cuidado.

São marcas,
não feridas.
Sinais de que houve encontro,
de que algo em mim
foi tocado
pra nunca mais ser o mesmo.

E não quero esquecer.
Não preciso arrancar lembranças
pra seguir.
Carrego-as comigo
como quem carrega cicatrizes bonitas —
daquelas que contam histórias
sem precisar doer de novo.

Algumas pessoas partem,
mas antes disso
plantam coisas que nascem devagar
no chão secreto da alma.

E o que floresce ali
nem sempre tem nome,
mas tem raiz.

 

segunda-feira, 11 de maio de 2015

NO DEDO DO VENTO

 

No Dedo do Vento

Abre a noite, e o vento, mão invisível, acaricia a cortina fina. Ela dança, flutua, fantasma branco no batente gasto da janela.

O frio entra, traz a cidade que dorme, um gigante adormecido lá embaixo. Mas o vento não dorme, ele sopra segredos nas coroas das árvores, fala em línguas antigas que só a folha entende.

Cheiro de terra úmida, lembrança de chuva que passou, ou talvez de outra chuva, muito antes, em outro tempo, outra vida. Memórias soltas no ar, carregadas pelo sopro errante.

Lá no alto, as estrelas são pontos frios, ouro velho salpicado no veludo preto. Elas olham, sem ver, sem sentir o murmúrio que tece a noite.

Aqui dentro, a penumbra suave acolhe o silêncio. Guarda as palavras não ditas, as perguntas sem resposta, e um punhado miúdo de esperança, esperando o amanhecer no colo da escuridão.

O ALFABETO ESQUECIDO DO AFETO

  

O Alfabeto Esquecido do Afeto

( e o amor se comunicava em línguas antigas)  


Não era o "eu te amo" ruidoso dos filmes, nem as mensagens rápidas na palma da mão. O amor deles tinha o passo lento dos séculos, a cadência das marés que beijam a areia e recuam, deixando rastros de espuma e mistério.
Comunicavam-se em hieróglifos da alma, desenhados no ar com o contorno dos dedos trêmulos, uma gramática de olhares profundos que falavam mais que a voz. Usavam advérbios de silêncio, conjugavam verbos no tempo dos suspiros contidos.
As palavras, quando vinham, eram como pergaminhos amarelecidos, frases cunhadas em um idioma que o mundo esqueceu. Um "fica" dito com a urgência branda de quem sabe que a permanência é um milagre diário. Um "lembra-te" que não pedia recordação, mas selava pactos além da memória.
Eles liam o amor nos veios da madeira antiga, no pó que dançava nos raios de sol que entravam pela fresta. O amor era uma runa gravada no tempo, incompreendida pelos apressados, mas perfeitamente clara para os que ainda sentiam o eco das línguas antigas, aquelas que o coração jamais permite que se percam de verdade.


 

quarta-feira, 8 de abril de 2015

TENTANDO DECIFRAR O INVISÍVEL EM VOCÊ

 

Tentando Decifrar o Invisível em Você

Eu te via em fragmentos, em gestos soltos,

Na superfície clara do seu riso,

Na melodia óbvia da sua voz.

Achava que te conhecia, que a história

Era só o que se mostrava, sem mistérios.

Mas algo me puxava, um eco sutil,

Uma certeza de que havia mais.

 

Então tentei decifrar o invisível em você.

Não o que seus olhos mostravam, mas o que guardavam.

Não o que suas palavras diziam, mas o silêncio entre elas.

Busquei as curvas da sua alma, os arabescos ocultos,

Aqueles traços que só se revelam

Quando o coração se permite aprofundar.

 

Fui atrás do vento que te movia,

Das raízes que te prendiam,

Das estrelas que te guiavam em segredo.

Cada silêncio seu era um enigma,

Cada hesitação, uma porta a ser aberta.

Procurei a cor dos seus sonhos não ditos,

O peso das suas alegrias guardadas.

 

Não foi fácil. O invisível é assim,

Resiste à lógica, se esconde na luz.

Mas cada fragmento descoberto,

Cada nuance revelada no seu olhar,

Era um tesouro, uma nova peça do seu quebra-cabeça.

E percebi que a beleza maior em você,

Não era o que podia ser visto, tocado ou falado,

Mas aquilo que, mesmo sem forma,

Redesenhava o meu mundo a cada descoberta.

O invisível em você era a própria magia.

 

 

 

 

 

Outro tema: a cor dos seus sonhos não ditos

 

 

A Cor dos Seus Sonhos Não Ditos

Eu te via no dia a dia, em tons reais,

A paleta da rotina, clara e definida.

Conhecia o azul do seu céu quando estava feliz,

O cinza suave quando a tarde pesava.

Mas havia algo além do visível,

Um universo particular, um véu sutil.

 

Eram os seus sonhos não ditos,

Pintados em matizes que só você podia ver.

Não era o vermelho da paixão declarada,

Nem o verde da esperança que se mostra.

Mas talvez um âmbar antigo de um desejo esquecido,

Ou o violeta profundo de uma ambição secreta.

 

Eu tentava imaginar essa paleta oculta,

A cor daquele voo que você guardava,

O brilho do ouro de uma vitória silenciada.

Seria um tom pastel de uma memória infantil,

Ou um azul elétrico de uma ideia que te acendia,

Mas que nunca encontrava voz.

 

E nesse esforço de te decifrar sem palavras,

Nesse mergulho na nuance invisível do seu ser,

Percebi a beleza da sua complexidade.

Pois a cor dos seus sonhos não ditos

Era a sua verdade mais pura, mais íntima,

Um jardim secreto onde as flores floresciam em tons únicos,

E onde eu, mesmo sem ver, aprendia a amar cada matiz.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

CONFUSAMENTE VERDADE

 

Confusamente Verdade

pode ser confuso,
se for verdadeiramente confuso.

pode ser quebrado,
se for a quebra que me atravessa.

não quero mais enfeitar o caos
com fitas de mentira.
quero dizer
como é:
torto,
estranho,
feito labirinto de espelhos rachados.

às vezes amo no escuro,
às vezes erro no claro,
às vezes paro sem saber onde doeu.

e tudo bem.
se minha bússola gira sem norte,
é porque o mundo também gira,
e eu apenas danço —
atrapalhado, mas inteiro.

não me exijo o mapa perfeito.
prefiro a trilha confusa
que ainda é minha.

prefiro o tropeço honesto
à linha reta vazia.

prefiro ser
verdade,
mesmo quando verdade
é só um tropeço bonito.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

O DESENHO DO INVISÍVEL

 

O Desenho do Invisível

Ninguém o vê, mas todos sentem seu traço,

O escultor etéreo, de dedos ligeiros.

Ele não usa cinzel nem barro,

Sua arte se inscreve no movimento,

Na dança súbita da folhagem,

No ondular dourado do campo de trigo.

 

A curva que o vento faz...

É um arco impreciso, uma geometria fluida,

Nunca a mesma, sempre fugidia.

No cabelo que se levanta em desalinho,

No tecido que se infla como vela,

No sussurro que percorre a grama.

 

É uma caligrafia sem palavras,

Uma mensagem cifrada na natureza.

A curva que ele traça no lago sereno,

Um espelho que se ondula e reflete o céu.

No fumo que escapa da chaminé,

Uma espiral efêmera que se desfaz.

 

Observar a curva que o vento faz,

É tentar decifrar o invisível,

Sentir a força que não se prende,

A liberdade que não se nomeia.

É perceber que o mundo está em constante escrita,

Com letras de ar e vírgulas de folhas,

E que a mais bela das artes, às vezes,

É aquela que não deixa rastro visível,

Apenas a memória da sua dança.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

RAIZ SILENCIOSA

 

Raiz Silenciosa

 

Sou herbáceo de nascença.

Não sou árvore de tronco forte,

nem montanha de pedra antiga.

Minha origem é terra macia,

o primeiro broto que se estica.

 

Minha força não está na altura,

mas na resiliência da raiz,

na seiva que corre sem alarde,

no verde que renasce a cada giz

de sol que o céu me dá.

 

Dobra ao vento, mas não quebra.

Sinto o orvalho na pele fina,

e na calada, floresço,

uma vida simples e genuína.

Sou a grama que ninguém nota,

mas que cobre o mundo.

A vida que persiste,

pequena e profunda.

 

sábado, 23 de agosto de 2014

ENTRE O AGORA E O INFINITO INSTANTE

 

Entre o Agora e o Infinito Instante

Eu fecho os olhos e tento capturar.

Não o tempo, não o espaço,

mas a sensação deste exato momento.

O calor da cadeira sob meu corpo,

o som distante do tráfego na rua,

o próprio batimento do meu coração.

É um ponto minúsculo na vasta tapeçaria do universo,

mas é o meu universo inteiro, agora.

 

Eu sinto a vertigem.

A consciência de que este "agora"

já está escorrendo,

se tornando "antes",

enquanto o "depois" se aproxima,

veloz e inelutável.

É a dança constante entre o que é e o que será,

um fio tênue que me conecta

a um futuro incerto.

 

Penso nas infinitas possibilidades que habitam cada segundo.

A palavra que poderia ser dita,

o caminho que poderia ser tomado,

a escolha que molda o amanhã.

E percebo que, neste instante efêmero,

reside uma eternidade.

A capacidade de respirar, de sentir, de pensar,

é um milagre que se renova a cada tique do relógio.

 

Eu abro os olhos e o mundo continua lá,

em seu ritmo implacável.

As pessoas apressadas, as luzes da cidade,

a constante mudança que tudo permeia.

Mas algo em mim se acalmou.

A compreensão de que o infinito não é um lugar distante,

mas a própria essência do presente.

 

Eu me permito habitar este entre-lugar,

nem preso ao que passou, nem ansioso pelo que virá.

Apenas existindo, plenamente,

neste delicado equilíbrio

entre o agora que pulsa

e o infinito instante que me abraça.

E neste espaço, encontro uma paz profunda,

a certeza de que cada respiração é um universo em si.